quarta-feira, 19 de março de 2014

Guias pintadas

Queria muito poder te desejar parabéns.
Queria também te chamar de cidade querida, e dizer do orgulho que tenho em ser sua filha.
Mas eu não posso... 
Não posso porque com o passar dos anos, tenho visto você degradar, Ribeirão. 
Vi você crescer, e ficar populosa de forma desordenada.
Vi tantas pessoas chegarem e te ocuparem sem terem o mínimo de carinho por você. Também vi você ser governada tantas vezes pelos mesmos, e tão poucas mudanças em tantos governos repetidos.
Vi um pequeno centro de cidade perder um morro (retiraram uma montanha!) para sua expansão. As ruas se transformaram, os carros as ocupam, as pessoas se amontoam.
Gostaria de dizer Ribeirão, das vantagens de se morar em uma cidade pequena, com aspectos de cidade interiorana, tão próxima de uma capital.
Gostaria de ter orgulho de criar meus filhos aqui, com o sossego que vivi em minha infância. Com a porta de casa quase sempre aberta, os vizinhos entrando e saindo, nós todos brincando na rua.
Gostaria de não ter preocupação com a segurança do meu lar, como já foi um dia. Nem me preocupar em virar estatística com meu carro estacionado nos pontos onde já ficou "normal" ser roubado.
Gostaria que meus filhos pudessem andar a pé, como fiz tantas vezes, sabendo que teria segurança pública para cuidar deles.
Adoraria passar pela estação de trem, linda e culturalmente rica, cheia de histórias, e poder pensar apenas em quantas vidas aqueles trilhos já carregaram, e não precisar me preocupar em desviar de ambulantes que ocupam aquele espaço, invadindo meus ouvidos com gritos e buzinas.
Gostaria de passear pela Rua do Comércio, sem aqueles cheiros de ervas medicinais, com calçada limpa, sem sons de açougues anunciando preços baixos com piadas inadequadas e músicas de mau gosto.
Gostaria de poder usufruir daquele espaço tão colonial que já foi a Vila do Doce, com seus sobradinhos coloridos e apenas me sentir grata em ter charme na nossa cidade, ao invés de perceber que nem o chão é lavado, ou consertado, e ainda, perceber que tal espaço voltado para a alimentação, tantos comerciantes fazem o horário que querem e se mantém fechados, pasmem, em pleno horário de almoço.
Gostaria de ver as pessoas andando nas faixas, respeitando sinais, respeitando ao próximo. Mas só vejo gente impaciente, atravessando no meio da rua, mesmo que tenha uma faixa a cinco metros dali.
Queria, crescendo em uma cidade com tanto verde, tanto território, ter um espaço para passear com minha família, onde pessoas pudessem ler seus livros, andar de bicicleta, correr... E não depender de outras cidades para ter este tipo de lazer.
Queria ver seus muros sem estarem pichados, sendo zelados pela população jovem que seria orgulhosa de você, Ribeirão.
Adoraria saber que nossos músicos e artesãos teriam um espaço para divulgar seus trabalhos. São tantos artistas em uma só cidade... Seria fácil torná-la alvo para novo comércio, com feiras artesanais, apresentações, musicais e peças.

Porém, Ribeirão, no dia do seu aniversário, eu só posso lamentar.
Lamentar pelo mato que ocupa suas ruas, calçadas e terrenos. Lamentar pelo descaso em seu cuidado.
Lamentar pela insegurança e rotina que isso já se tornou.
Lamentar pelos excelentes profissionais que você tem e que permanecem inativos por falta de incentivo.
Lamentar pela sua desordem, pelo povo que te ocupa.
Lamentar por não ter orgulho de você, como já tive um dia.

Eu queria mesmo, era ter motivo para comemorar suas guias pintadas para essa data.

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