quarta-feira, 26 de julho de 2017

Dor coada

Era tamanha a dor que eu sentia,
que minh’alma jazia em pó.

Peguei água quente
em temperatura fervente

pensei 'calor pode ser engolido'
quem sabe a água em grão moído
esquente coração em tecido puído?

Mas café não aquece quem sente
o pulsar de dor tão latente

peguei essa água fervente
joguei na dor macerada 

coei minh’alma que jazia
e de tal mistura 
nasceu poesia.


segunda-feira, 17 de julho de 2017

Talvez você não saiba

Algumas coisas talvez você já saiba, mas muitas, é possível que não.
Talvez você não saiba que foi desejado por muito tempo e que foi comemorado, vibrado e celebrado por mim, em uma alegria imensa, mesmo dentro de tanta ignorância da minha parte sobre o quê a sua chegada poderia fazer.
Talvez você não saiba, que de minha parte, não houve um momento sequer de arrependimento, mesmo dentro de  tanta dificuldade de uma separação, de um relacionamento prematuro.
Talvez você não saiba, mas a prematuridade da separação seja o momento mais maduro de um relacionamento falho, infantil e cheio de razões para não perdurar. Mas que deu à mim de presente, o maior presente que alguém pode receber.
Talvez você não saiba, mas meu retorno ao trabalho foi cheio de tristeza e choro camuflado, porque eu me sentia abandonando o que havia criado, mesmo você sendo cuidado por tão boas mãos (para você, não haveria no mundo outra melhor).
Talvez não saiba, que existiu uma dificuldade financeira nesse núcleo, e que tantas vezes foi camuflado. Talvez você não saiba, que eu passei dificuldade, alguns dias até mesmo fome, para que a cifra que entrasse no banco pertencesse à você.
Talvez você não saiba, mas um dos meus dias mais difíceis, minha maquiagem foi refeita três vezes e não disfarçou em nada a minha chegada ao trabalho depois de você entrar em minha mala e dizer: “ - Leva eu escondido, mãe, eu cabo aqui”. 
Talvez você não saiba, mas o dia que percebi que meus presentes eram mais interessantes que a minha chegada, eu fechei a porta do quarto e chorei.
Talvez não saiba que vivi dias sombrios com medo de você não ser devolvido, sendo ameaçada do seu não retorno ao lar.
Talvez não saiba que eu sabia que esses momentos todos eram apenas uma fase e que você cresceria, e entenderia toda a verdade e respirei fundo, ocultei muito e sorri tantas vezes dentro de muita tristeza e indignação. Talvez não saiba, eu não me arrependi em agir assim.
Talvez você não saiba, eu sinto um orgulho imenso pelo homem que você se tornou, pelo filho e parceiro que é, pelo irmão responsável e crítico, pelo aluno dedicado e ativo, pelo amigo sincero e acolhedor, por ser um ser humano empático e auto-analítico.
Talvez você não saiba, mas meu coração quase explode quando vejo você acariciando um de nossos bichinhos. Ou quando se emociona ao ver algum. Pela sensibilidade que existe dentro de um homem tão maduro em tão pouca idade.
Talvez não saiba que eu me emociono com o relato de querer ser professor e mais, por ter se inspirado e ter como referência o que um professor e seu conhecimento causou em você.
Talvez não saiba que escuto todas (absolutamente todas) as palavras que você, com toda sabedoria e respeito do mundo me diz, e reflito sobre elas (as críticas especialmente), e que todas elas fizeram mudanças em mim.
Talvez não saiba que a forma que você me trata e o carinho que lhe é peculiar, me faz perceber que só quero pessoas com o seu jeito ao meu redor, e você é o responsável por eu me afastar de muitas, porque eu sei que dá para ser assim: cheio de amor, zelo, apreço. Você é minha referência.
Talvez não saiba que sua inteligência, a forma que trata às pessoas, a maneira que se dedica, são observadas em tempo integral, por mim e por suas irmãs, e aos sussurros, nós nos envaidecemos com isso.

Talvez não saiba que o dia que você nasceu, nasceu em mim o maior medo e o maior amor que existem no mundo, e por você e para você, eu faria qualquer coisa, faria tudo de novo, e continuarei fazendo até enquanto eu respirar.

Talvez não saiba que eu desejo à você todo esse amor que você fez nascer em mim. E que eu desejo que você experimente, sinta, e se aqueça com todas as vantagens de amar assim.
Talvez não saiba que meu desejo é que sua vida seja recheada de história, não pela profissão escolhida, mas por experiência vivida. E que desejo, que em sua velhice, você esteja rodeado de pessoas que ama, ouvindo a toda a narrativa do que você construiu, viveu e sentiu.
E desejo que você nunca tenha dúvida de quanto eu te amo e de tudo que ainda quero fazer com e por você.



*Homenagem ao aniversário de meu filho Leonardo Lazari

domingo, 16 de julho de 2017

Sinestesia



Onde contato, nasceram flores
onde passado, tocou melodia
onde voz, cresceu conquista
onde evidência, manifesta censura
onde vontade, apenas foto
onde distância, morou contato
onde ânsia, ajuda em pílula
onde medo, quita cifra
onde realidade, abranda o álcool
onde sinestesia, sabor colorido
  
onde amor, plena saudade

e para este, não há remédio,
não há nota,
não há música,
não há repressão,
não há temor,
não há tempo,
não há idade,
porque nele, jamais deixou de ser

saudade.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Em sua lápide

E em sua lápide estará escrito:

Aqui jaz uma comissária que aprendeu a voar:
Que voou por seus sonhos e por tantos outros que carregou.
Que distribuiu sorrisos enquanto sua dor escondida latejava na saudade deixada.
Que desenvolveu por instinto a habilidade de prever fatos, porque aprendeu a sentir o ar.

Que orou para que perdoassem a sua ausência, enquanto se fez presente em tantas outras histórias.
Que colecionou lugares, lembranças e amizades francas, mesmo enquanto curtas.
Que foi anjo para alguém, mesmo quando dentro de si não existia um céu.
Que muitas vezes chorou a distância, ouvindo também as lágrimas (de longe) do seu lar.
Mas sempre retornou para seu lugar. 

E agora, plana livre no céu que lhe pertence de fato,
porque ela, justamente,
aprendeu a voar.