sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Magnata


Eu só quero companhia de pessoas ricas ...

Eu aceito companhia para o passeio no parque, para o piquenique, para ficar deitada na grama assistindo as nuvens passarem.
Aceito companhia para um cinema, para uma pipoca ou para um filme no sofá.
Aceito a chamada para um café: pode ser no bistrô, na padaria ou em pé na cozinha.
Aceito dar uma volta pela praia, caminhar descalça na areia ou para o banho de mangueira no quintal.
Aceito parceria para o banho de chuva. 
Aceito companhia para meia hora de risada, pra falar só de coisas boas ou bobagens: para esquecer a parte dura da vida e desanuviar.
Aceito parceria para um abraço, daqueles bem fortes, onde tudo em volta desaparece e o mundo fica restrito a apenas dois corações.
Aceito um telefonema com boas notícias, para um alô de saudade ou qualquer palavra que faça suspirar.
Aceito companhia para uma cerveja, ou para um copo de água gelada, para saciar o calor da alma e do coração.
Aceito parceria para olhar as estrelas, para sonhar com o futuro. Para admirar o pôr do sol ou o nascimento dele.
Aceito acompanhante para uma corrida, para uma caminhada, ou para sentar à sombra de uma árvore.
Aceito companhia que não despenda necessidade de gastar dinheiro para impressionar, mas que esteja disposta a gastar energia com alegria.
Aceito companhia que seja rica em empatia, amor, e sinceridade: bens que fazem uma elite rara. 
Aceito companhia para compartilhar uma fortuna que não se guarda em banco, não existe em apólices, mas que torna seu proprietário dono de uma riqueza infindável. 

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Durante o jogo


Eu não sou alguém importante, faço parte daquela massa gigante das pessoas comuns. 
Não tenho destaque em nada. Sou só mais uma pessoa.
Só que faço parte de um time. Do Time dos Tontos.
Sou do time dos bobocas:  daqueles que chega no ambiente de trabalho rindo para todo mundo e fica tentando fazer todo mundo sorrir também.
Sou daqueles que leva em consideração o bem estar de quem está em volta e de quem chegará daqui a pouco. Dos que se preocupa com a consequência e quer fazer o melhor que pode.
Sou daqueles que fala a verdade. Que fala a verdade olhando nos olhos. Sou daqueles que não se aproveita, e que fica bem sem graça, quase sem jeito, quando tem alguém querendo ajudar, mesmo quando precisa.
Sou daqueles que assume as próprias cagadas e fica dias sem dormir depois de fazer uma. Dos que não dorme quando está triste também.
Sou daqueles que chega no horário (e fica preocupado em cumpri-lo). Sou dos que cumpre o compromisso. 
Daqueles que fala que fará e faz, mesmo querendo não fazer: mas acordo é acordo e deve ser cumprido.
Sou daqueles que tem um inferninho próprio e sofre com as vozes dos anjos que insistem em que tudo deve ser perdoado, relevado ou deixado para trás.

Não sou um anjo em absoluto, mas, por fazer parte desse Time dos Tontos, sou quem é considerado “gente boa”.
Sou daqueles que é deixado para trás, porque não guarda mágoa.
Sou daqueles que não é escolhido, porque não terá chilique.
Sou daqueles que é provocado em último grau, porque querem testar o limite.
Sou daqueles que escolhem para entristecer, porque tem sempre bom humor.

E eu me pergunto, o que será que acontece na cabeça do outro time? Do Time dos Espertos?
Porque ouço todo mundo reclamar que o “ser humano” não tem jeito, que cansaram das pessoas: que desconfiam, que mentem, que escondem, que abusam.
Aqui, do Time dos Tontos, eu posso afirmar: cansa ser desse time e normalmente, quem está nele é titular… não para no banco de reserva. Está sempre em campo, lutando com um adversário que tem melhores jogadores, mais bem preparados, muito mais atentos e cheios de ginga.
O Time dos Espertos tira um sarro de nós. Mas reclama dos seus próprios jogadores. Aliás, o Time dos Espertos, fala, fala, fala e quase sempre que precisa agir mesmo, se finge de contundido.
O Time dos Espertos vive se glorificando de suas conquistas, mas não percebe que seus praticantes são exatamente o motivo de suas queixas.
O Time dos Espertos tem arrecadado muitos simpatizantes. O Espertos aumentou, e nem percebe. E ainda pior: eles têm jogadores infiltrados entre os Tontos. São os Espertos que se fingem de Tontos.

Nós, do time dos bobocas, estamos perdendo. O outro time está nos convencendo de que não vale a pena ser tão bacana, nem tão querido, nem tão gentil. E quando um de nós fica chateado por um tempo pouco qualquer, vem um dos Espertos e incita (com muito sarcasmo): “Mas você não é uma boa pessoa?”
O time adversário conquista a cada dia mais jogadores dos Tontos: porque os Tontos cansam, esgotam e esvaem suas forças. 

Eu não sei o que se passa na cabeça do outro time. Sei só que sinto um cansaço danado em fazer parte do meu. 




sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Cápsula do tempo



Me perguntaram se saudade é bom ou ruim.
Respondi que saudade é sempre bom.
Saudade é amor e boa lembrança.
E nesses dois itens bons, não tem como haver sentimento ruim.

Saudade é capsula do tempo.
É aquele momento que, por alguns instantes, você volta em tempo remoto. 
Seus olhos se fecham e seu coração aperta: quando teu corpo te desobedece e o pensamento viaja longe. 
Você volta para um instante ou para um tempo que gostaria de ter pausado a vida e encostado por lá por um período longo. Onde você sentiu-se em colo quente, abraço apertado e aconchego justo. Onde seu coração parou de doer e bateu seus compassos ritmados e a vida te mostrou que havia sentido em tudo. Onde sua alma clareou seus olhos e o ar encheu seu pulmão com ar fácil, leve. Onde a vida te presenteou com suspiros e oxigênio extra. Em qualquer lugar, momento ou pessoa, onde tudo pareceu que daria certo, que haveria sentido em tanta perda anterior e haveria esperança em outras novas conquistas.

Quando sente-se saudade, o coração fica apertado, imitando um recipiente plástico que alguém pressiona e derrama o conteúdo.
Saudade é assim: é amor extravasado do coração em forma de lembrança.

Saudade não é um problema, e está longe de ser ruim.
Problema é a distancia que causa saudade. 
Ruim é o melindre ou o medo que fazem saudade.
Mas a saudade em si… ahhhh não… a saudade não é ruim.
A saudade é amor, em sua plenitude de insubordinação, que desobedece o sossego do dia-a-dia e recorda, com toda força possível onde houve tempo que foi permitido juntar amor, vontade, proteção e desejo.

Saudade é a única forma de voltar no tempo.
Uma forma de voltar num tempo bom.






sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Um menino na praia

Uma criança na praia.
Em muitas situações, seria apenas mais uma foto, de mais uma criança, em um dia de praia.
Mas essa não. Essa foto não tem uma criança brincando. Não tem bola, nem família ou alegria.
Nessa foto, apesar da mudez de toda fotografia, e mesmo sem sangue algum, tem o horror e o desespero de um mundo que imigra exasperado à procura de esperança de vida.

E essa imagem se espalha pelo mundo, agora com ilustradores  com criatividade em alta, sugerindo outras cenas, para que em nosso consciente, quem sabe, fique alguma coisa positiva, no meio dessa desgraça toda. 

É uma imagem triste, em meio a tantas outras imagens que temos do pandemônio do mundo. Mas sempre há alguém para registrar a imagem. 
Imagino que, naquela situação, não teria como o fotógrafo auxiliar com algum tipo de resgate, mas já presenciei cena qual as pessoas fotografam, filmam ou prostram-se pasmas, enquanto quem precisa de ajuda, permanece pedindo socorro, sem ser atendido.

A imagem do menino morto com o rosto na areia é angustiante, mas, mais lamentável é a cena de quem vê paralisado momentos como esse, todos os dias, e nada faz para mudá-lo.
E essa mudança, não precisa acontecer de forma macro, porque o ser humano tem mania de abster-se de culpa, imaginando nada fazer para mudar um todo. Não podemos mudar de forma generalizada mesmo, porque a mudança é individual.

A forma de sair do caos que nos encontramos é estudando muito, lendo muito e sendo um pouco menos egoístas. 
Aperfeiçoando nossos conhecimentos e sendo mais gentis com o mundo em geral. 
A começar pela nossa casa: em nossa família, ouvindo aos nossos filhos, pais ou cônjuge… dando conselho, sendo ouvidos e olhando nos olhos. Saindo mais desse mundo virtual e tendo mais contato humano.
Sendo mais gentis com aqueles que participam de nossas vidas: com o funcionário, com o prestador de serviços, com quem passa na rua.
Com menos ferocidade no trânsito, com mais afabilidade com colegas de trabalho, com mais cortesia no restaurante, mais civilidade nos serviços comprados.

Queremos menos guerra para um mundo inteiro, mas não paramos na faixa para o pedestre atravessar.
Queremos menos imagens de violência, mas damos audiência a programas que incitam o que é negativo.
Queremos um futuro melhor, mas presenteamos nossos filhos para compensar nossa ausência.
Queremos ser bem tratados, mas não temos a delicadeza de dar bom dia.

A criança na praia da Turquia é um reflexo do mundo que vivemos:
estamos estupefatos apontando o erro dos outros, impressionados com a violência, perplexos com as mortes.

E atônitos, assistindo a tudo, mas achando que somos perfeitos.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Não, obrigada


Não, obrigada.
Não quero mais ser assaltada.
Não aceito ser violada em minha intimidade.
Não permito mais que se aproximem e roubem meu melhor: que diminuam meu sorriso, meu bem estar ou minha quietude.
Não consinto que levem meu sossego embora ou alvorocem minha paz interior.
Não autorizo que amarelem a minha alma, que meu coração descompasse esquizofrênico, ou que o frio na barriga seja por medo ou pavor.
Não quero mais sabores amargos, pensamentos latentes ou respiração rasa.
Não carrego mais pedras que não sejam minhas, não levo nas costas peso que não seja meu.
Não serei mais bengala, apoio ou muleta de quem só chega para recarregar-se e vai embora como se não tivesse sequer passado por aqui.
Não quero quem aparece de vez em nunca e descarrega um caminhão de lixo, como se eu não tivesse o meu próprio para desovar.
Não quero próximo, nem por um segundo, quem abraça falso, quem profere palavras vagas e frias, quem não tem amor pra dar. 
Não quero junto quem não tenha amor ou não saiba o que é amar.
Não, obrigada.

Não quero mais problema de quem apenas tem problemas para dar.