Sob a cadeira
poesia de uma vida inteira
Em uma caixa de papel grosso
Pedaços de impressos soltos
Contêm as letras de mãos unidas
Dançando na revoada
Do poeta, as ideias soltas
Sob a cadeira de madeira
Poesia de uma vida inteira
Entalhadas em folha pautada
Entre tintas e garranchos
Os sonhos e solavancos
De quem, de amor, fingindo sofre
Ou sofre, verdadeiramente amando
Sob a cadeira de madeira inteira
Poesia de um vida e meia
E há quem saiba que nessa caixa
Tem mais experiência do que invento
Além daquele - do próprio poeta -
Quando finge conhecido tormento?
Sob a cadeira de uma vida inteira
Poesia de qualquer maneira
E nesse escritório considerado
Nesse nada enfadado arquivo
Exprimem-se dores, amores, cores
Dos tantos sentimentos já sentidos
Sob a cadeira de qualquer maneira
Poesia meia ou poesia inteira
Nesse tanto, papel riscado
Criativo sonho arquivado
Representa um fado ou teatro
Quando da caixa tirado
Sob uma vida inteira
Poesia encaixa ligeira
Porque tudo que nasce
De tal poeta
Exprime amor retratado
E tanta vida, tanto poema
Não deve ficar guardado
Que saia de sob a cadeira
Poesia de uma vida inteira
* Homenagem à Márcio Azevedo, homem cuja cadeira oculta precioso arquivo.