sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Ao leitor



Enquanto olhos atentos
escutam em boca oculta
o que intelecto estrutura em ideia
palavras e chacotas contidas.
Escuta-se música baixa
Movimento ordenado
Planilha organizada
em mente revolucionária
algemada em contenção.

É uma paz nada mascarada
É só uma fórmula, de quem:
muito  pensa
nada sossega 
e muito cala,
Mas por dentro sempre ri.

P.S.: Em desobedecimento e homenagem ao leitor #35.000. 


sábado, 21 de novembro de 2015

Aonde foi parar



Acordei em qualquer tempo
onde não havia espaço
não havia sentido
muito menos, amor.

Abri os olhos
em qualquer dia, onde todo segundo é vazio
e tanto momento bonito se esvai em milímetros.

São muitos mil metros 
que nos separam
e não param de correr.

Para quê tanta corrida
se a única intenção era encontrar um só lugar?
Um lugar onde o coração abrandasse
e a alma respirasse grande
todo o sentido de viver...

Eu só não sei aonde for parar
tanto bem querer
tanto amor
e tanta promessa.
Ou talvez, tanta mentira.





segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Sinto muito

Sinto porque não sou só
sinto porque não sou única
sinto porque não sei.

Sinto porque queria diferente
e sinto porque não é.

Eu sinto pelo silêncio
sinto pela distância
sinto pelo sentido todo
que não tem nenhum.

Sinto por tanta palavra calada
e por tanto calor gelado
e pelo pulmão vazio.

Sinto pelo espaço
onde antes havia beleza
e que hoje habita estio.

Eu só sei que sinto,
e sinto muito.


sábado, 14 de novembro de 2015

Por favor, esconda meu tablet.

Fui presenteada com uma cópia em DVD de umas memórias de infância.
Nela, alguns vídeos feitos em casa, onde nós, os três irmãos, mais alguns amigos e vizinhos, reproduzíamos filmes, como Romeu e Julieta, Star Wars e Indiana Jones. Tudo apenas com muita criatividade e uma câmera, coisas da infância de crianças que têm pais que trabalham (e aprontam enquanto eles estão longe).

Minhas filhas  adoraram o tal vídeo e a Mel o reproduz com frequência. Até que, um dia, ela chega chorando e pedindo: “por favor, esconda meu tablet de mim! Eu não quero mais usar!”
Uma investigação bem rápida já detecta o problema: “Eu quero ter a infância que você teve. Você brincavam o dia todo e a gente só fica mexendo em computador.” Ela ainda disse mais um monte de frases tristes, que apontaram a escravidão da internet, a falta de amigos não virtuais e claro, a necessidade daquela alegria que mostramos nos filmes.

Tive que começar explicando que nem tudo eram flores: nós não ríamos o tempo todo e o ócio era presente em muitos dias. Pedi para que ela prestasse atenção em algumas partes pontuais, onde claramente, havia discussão e briga. Falei da dificuldade e das besteiras que fazíamos. Tive que explicar que o tablet não tem culpa, mesmo porque, ele faria a vez da câmera (como tantas vezes faz nos pequenos vídeos que ela e a irmã tem gravado). Ele quem traz o acesso que hoje se faz necessário, e que talvez, a maior dificuldade hoje fosse não ter vizinhos próximos da idade para brincar, como eu e meus irmãos tivemos. Sugeri que a visita de amigas fosse mais frequente. Ela foi se acalmando com a conversa (que aconteceu depois disso mais umas duas vezes), mas a Mel, por si, decidiu diminuir seu acesso à internet (o que, em casa, é estipulado apenas uma hora por dia, após todas as tarefas imprescindíveis serem realizadas).

E nós confabulamos coisas sobre o tal vídeo, minha infância, e a própria internet…
Me instigava elas gostarem tanto assim daquele vídeo caseiro. E ainda, especificamente de uma filmagem, que a mim incomoda muito: me sinto uma idiota. Elas adoram e explicaram depois: “a gente gosta porque você está muito divertida”. E eu tive que entender, que a idade e as brincadeiras feitas, são correspondentes às delas hoje. Elas se identificam.
Exploramos o fato que a infância delas, não têm como caber na minha. Estamos falando de quase trinta anos de diferença, e esses anos fazem diferença sim: o mundo é outro, as pessoas são outras. O comportamento mudou, o individualismo aumentou, as árvores diminuíram em quantidade e o fluxo de trânsito é 10 vezes maior: não dá mais pra subir num pé de jabuticaba,  brincar na rua de taco... A jabuticabeira do meu quintal não tem nem um metro de altura, e está em vaso… isso porque, ainda tenho uma! Apesar da casa ser a mesma daquela minha pouca idade, os vizinhos, quase todos, não são. As pessoas mal se falam, quando muito um cumprimento rápido. E seus filhos estão em seus tablets, ou fazendo os muitos cursos extras que o mundo exige de uma criança. Afinal, temos que ser adultos preparados para esse mundo, não?
A infância de meus filhos é diferente do que foi a minha,  assim como a minha foi diferente da de minha mãe, e por aí afora. Fomos perdendo contato com a terra, com os animais e com as pessoas. Temos acesso ao mundo inteiro em uma tela, mas estamos aprisionados na necessidade da atualização imediata, enquanto o que tínhamos de mais adequado (o contato pessoal), perde-se em apenas cliques virtuais.
Perdemos uma parte do nosso precioso tempo, ou seja, dos nossos minutos de vida, precisando saber o que acontece do outro lado do mundo, sem saber o que se passa com a pessoa que está ao lado. E precisamos usar alternativas e criatividade para ter acesso à natureza.

“A internet tem suas vantagens”, eu expliquei para a Mel, “hoje, se você tem uma dúvida, com uma pesquisa rápida, você encontra sua resposta. Na minha infância, precisava ir à biblioteca e abrir livros gigantes para tentar encontrar uma pesquisa”. 
Não penso que nenhuma das alternativas seja excelente: minha sugestão foi usar a internet para otimizar o tempo e então, desfrutar do tempo livre com um bom livro.

A Mel comprou a ideia. A Julia já tinha comprado e o Leo também é usuário. A internet não pode nos aprisionar, não deve ser uma premissa. Ela é uma ferramenta! E nós, precisamos aprender a usar. 
O ideal é usar a tela para atualizar-se, mas ter um vida, uma vida real mesmo, com amigos, conversa fiada e conversa séria, família unida e jantares, abraços e beijos de verdade.

A Mel entendeu algumas outras coisas: a grama do vizinho parece sempre ser mais verde. Mas a vida não é bem assim. Precisamos valorizar o nosso. Cada um sabe quanto preço se paga para ter o que tem: família, amor e amigos. Isso tudo despende trabalho árduo. 

E eu, fiquei com uma vontade danada de voltar a ser aquela menina de cabelos volumosos e olhos grandes, qual aparece na filmagem do DVD. 
Deixei de ver a menina que era como uma idiota. E minhas filhas me mostraram que estou levando a vida muito à sério. 

Preciso também esconder. Preciso aprender a esconder (de vez em quando) um adulto e voltar a ser mais divertida. ;)


segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Suspiro




Perdeu-se em qualquer lugar,
onde o ar rarefeito é substituído
por névoa cinza pesada.

Onde antes havia bem querer
e imensidão preenchida,
é vaso raso, com terra infértil.

E o que era esperança, agora é só tolice assumida
de quem a cada dia
espera menos,
escreve menos,

e cala mais.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Positivo


Estava sozinha, no banheiro de um hotel em Miami.
Havia saído para passear com algumas colegas e, já com uma pulguinha atrás da orelha, decidi, discretamente, comprar um daqueles exames de urina caseiros.
E, com o coração dando pulinhos de ansiedade, deixei o tal exame, que mais parecia uma caneta, pousado sobre o balcão do banheiro nada acolhedor.
Resolvi esperar no quarto pelos três infinitos minutos prometidos para o resultado, e segurei ainda mais uns dois minutos extras, para ter certeza que não teria me adiantado e não visse resultado errôneo.
Nas duas janelinhas da caneta/exame, havia uma faixa azul, que significava: positivo.

Entre as tantas dúvidas que perturba a mente de uma mãe, existem os vários medos e ânsias para que a gestação  dê certo, que o bebê seja saudável, e a vida seja amena para a família em geral.
Ler um positivo pela terceira vez, não trazia os mistérios de uma gravidez, mas ainda sim, novidades e novos desafios.
A começar por conhecer sua presença estando sozinha, em terra distante e sem ter acontecido planos para sua chegada.
Em explicar para seus irmãos que havia mais uma pessoazinha em breve e que a atenção deles seria ainda mais dividida.
Na responsabilidade de conduzir um lar, com dois tripulantes sendo responsáveis pela criação de três filhos: nossas ausências tantas e a saudade muita.
Na adaptação toda da chegada de um bebê, que dessa vez, aconteceria com uma mudança de casa, mudança de apoio, mudança de estrutura.

Aqueles medos todos, a ansiedade alta e as possíveis inseguranças esvaíram-se quando as 22 horas do dia 04 de novembro, aqueles olhos azuis me olharam pela primeira vez. E desde então, permaneceram com a mesma expressão de atenção.

Chegou atenta a tudo e a todos, e cativando, com sua sagacidade e desenvoltura, àqueles que a conheceram de perto.
É impossível citá-la , sem colocar todas suas qualidades em pauta. E quem disse que é uma menina sem defeitos? Não, não é.
Mas é uma menina com virtudes em dimensões que muito adulto não consegue alcançar, e que essas qualidades se sobrepõem aos poucos defeitos humanos que têm.

É menina que aprendeu rapidinho a espantar seus pequenos monstros, que chora de tristeza, mas que em poucos minutos canta alegremente e nessa fórmula contagia a todos.
É pessoa que observa, avalia e questiona, sem sentir melindre, mostrando uma maturidade acima de sua idade.
É menina ácida, com velocidade de pensamento espantosa, e cheia de ironia quando precisa se proteger.
É brincalhona, divertida. É contagiosa na maneira de viver.

Está crescendo percebendo todos os venenos que existem no mundo e aprendendo a se defender deles. Entende com precisão inúmeros sentimentos que muita gente barbada não consegue distinguir. 

Ela foi uma novidade. Uma novidade para todos, chegou chegando, quebrando todas as antigas teorias, os imaginados conhecimentos.
Ela chegou num misto de ingredientes positivos, que o tal exame inicial não detectou.

Ela trouxe doçura, carisma, rapidez, vivacidade, alegria e astucia. Uma mistura maravilhosa, que refletem seus olhos claros, e que somente quem convive e consegue provar seus sabores, descobre quão diferenciado esse mel é.

Ela é um positivo em toda extensão da palavra.

Seu nome é Mel. Mas quem vive de suas doçuras e prazeres, somos nós.