sexta-feira, 4 de julho de 2014

Efeito Angélica

Pedro amou Angélica.
Amou Angélica intensamente. Via nela o anjo e o demônio que vemos quando amamos verdadeiramente. Tinha nela a segurança, certeza, reciprocidade, planos, projetos, química, companheirismo, inteligencia, diversão, prazer, colo, amizade.
Angélica foi completa. 
Até deslizar: até deixar de ser parte anjo e ser demônio completamente, no dia que deixou a carne falar mais alto e sucumbiu à aproximação de Julio.
O mundo de Pedro ruiu. 
Pedro parou naquela parte do poço onde todos nós já estivemos. Onde é escuro, lamacento, frio, úmido. Onde vozes gritam dentro de sua cabeça. Onde o coração dilacera. Onde o tempo para. Onde tudo parece infinito, indeterminado, imprevisível.

Como todos nós também, Pedro, um dia, descobre que a única saída é para cima. E reunindo todas suas forças, escala, com corpo puído, a jornada de retorno ao mundo. E o poço se torna apenas memória latejante.

...
Pedro, claro, sobreviveu. E viveu. Podemos dizer que bem.
Conheceu outros amores. Viveu outros sabores. Mas nunca como o da Angélica.

Outras Angélicas apareceram. E essas outras Angélicas eram quem faziam os joelhos de Pedro não terem força. Nestas outras Angélicas Pedro achava o amor que sempre acreditou existir.
Mas, por causa daquela primeira, Pedro não queria mais Angélicas.
Pedro não queria mais nada que não fosse controlado, que não fosse dependente, que não fosse previsível.
Apesar de sentir amor por outras Angélicas. Pedro não queria mais sentir amor.

Pedro não quis mais sentir.
Pedro preferiu uma fórmula.
Preferiu controle.
Deu vez à razão, encontrou Patrícia, e fez com ela o que pensa ser direito: construir família, mesmo sem emoção, mesmo sem borboletas no estômago, mesmo sem amor absoluto.
Pedro aprendeu a amar Patrícia. Porque Patrícia depende de Pedro para viver. E enquanto ele estiver no controle, ele encontra adormecido o demônio instalado nele há tantos anos.

Enquanto Pedro conheceu Angélicas, ele sorria feliz. Ele suspirava, ele sonhava.
Mas não foi isso que ele quis.
Ele prefere adormecer em sua solidão acompanhada de corpo quente, de coração morno.
Enquanto as Angélicas adormecem sem seu Pedros, chorando vida que se arrasta em desconsolo, porque Pedros não querem viver Angélicas.


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