quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

O Paulo e o pai do Paulo

- Alô?
- Amiga, você sabia que o pai do Paulo está no hospital?
- Ele está doente?
- Acho que não. Mas ele sofreu um acidente. 
- O pai do Paulo…
- Isso. 
- E ele precisa de ajuda, amiga?
- O pai do Paulo? Em quê você poderia ajudar?
- Não o pai do Paulo, o Paulo mesmo.
- Acho que sim, porque ele está sozinho, e a mulher está doente.
- A mulher do Paulo? Doente de quê?
- Não, não a mulher o Paulo, a madrasta dele. Está doente e não pode ficar no hospital.
- Estou confusa…
- Sei que o pai está lá, e o Paulo também. Pior, ele precisa fazer uma cirurgia e agora, terá que adiar.
- Meu Deus! Por quê adiar? O acidente foi tão sério assim?
- Terá que adiar porque precisa ficar no hospital com o pai. E se a mulher não pode ficar com o pai, quem ficará com o Paulo?
- Amiga, para. Quem precisa fazer a cirurgia?
- O Paulo, ué. E talvez vá pra UTI.
- O Paulo vai pra UTI? Operar de quê, meu Deus?
- Não o Paulo, o pai dele. Acho que precisa operar a vesícula.
- O pai?
- Não, o Paulo.
- Senhor…
- Eu só sei que fui ao mercado, porque tem uma promoção fantástica de sabão em pó, menina… e encontrei a mulher dele, que me contou tudo.
- A madrasta do Paulo, eu suponho…
- Não, a madrasta está doente, eu encontrei a mulher do Paulo.
- Sei…
- Sabe? Você conhece ela?
- Não, não conheço… concordei com a sua frase, só…
- Ai, menina, assim você complica a história…
- Eu? Complico a história? Até agora é você quem não está falando nada com nada! Hospital, mulher, pai, madrasta, mercado… está tudo sem sentido…
- Ahhhhh… fica calma, vai. Bom, é isso. Voltei pra casa porque queria te contar tudo. Saí quase correndo do mercado.
- Ok. Bom, obrigada. Acho então que irei pra lá.

- Você vai? Ai, amiga, que bom! Faz um favor pra mim? Aproveita que você vai lá e compra a tal promoção de sabão, porque nessa correria, eu esqueci de comprar…


segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Pode ser que você, moço


É, deve-se considerar.
Pode ser que, realmente, seja demais.

Pode ser que sorrir demais seja exagero.
Pode ser que dizer muita verdade seja abuso.
Pode ser que ter tanta esperança seja demasia.
Pode ser que enfrentar as responsabilidades todas seja exorbitância.
Pode ser que amar tanto seja overdose.
Pode ser que ficar em silêncio seja despropósito.
Pode ser que acalmar os ânimos seja encarecimento.
Pode ser que não fazer jogos seja descomedimento.

Pode ser que tanta habilidade não faça sentido.
Pode ser que tamanho interesse não seja interessante.
Pode ser que devida conduta não tenha mistério.
Pode ser que cabida imponência seja excessiva.

Ou pode ser, 
que ela não seja demais,
apenas você, moço,

seja de menos.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Talvez minha leitura



Querida amiga,

Eu fiz uma promessa que escreveria, e em algum momento, me dei conta… não sei mais escrever.
Pensei em tantos assuntos que eu poderia abordar, mas percebi também que não quero citá-los, não quero dar audiência à eles.
Percebi que tenho andado mais quieta, na minha, não criando confusão, pra ver se a minha confusão interna se organiza.
Percebi que tenho sentido muito, no sentido literal e que, literalmente, esse sentimento todo só confunde a escritora que não sou.
Entendi que tenho estado acuada e medrosa, com certo melindre, movimentos todos quais eu mesma já critiquei.
Descobri que estou imperfeita em tantos sentidos quais já aprimorei e, de repente, eles eclodiram em tamanho e velocidade das quais eu não tenho força física ou espiritual para conter.
Descobri que minha respiração anda bem profunda, mas não é um suspiro qualquer não, porque eu tenho para mim que o suspiro real enche com ar nosso pulmão e de esperança a nossa alma… esse meu, não tem sido assim: ele infla um órgão que está defasado exatamente destes itens e talvez, provavelmente, ele use esse recurso para que eu não me esqueça de mantê-lo ativo.
Percebi que estou exausta, exausta mesmo, por todas aquelas funções que sou obrigada a ser: por ser obrigada a ser madura, atenda, organizada. Por ser líder, mãe, e mulher. Por ser obrigada a sorrir e estar disponível. 
Estou exausta de abordagens frias, de pessoas grosseiras ou superficiais.
Estou exausta da falta de carinho, da falta de compaixão ou falta de empatia.
Exausta de engolir sapo, e farta de usar um desentalador. 
Estou exausta, justamente, em manter tanta calma em momentos que eu quero gritar.
Estou exausta de tantos altos e baixos e do tempo que tenho que esperar para isso tudo fazer sentido, sendo que tenho sentido profundamente esse tempo todo passar.
Descobri, querida amiga, que eu entendo o que é a tristeza e que eu sei lutar contra ela, mas que estou mesmo, precisando que alguém ocupe o meu lugar. 
Eu só sei do tal sentimento, que eclode todos os dias, e eu, teimosa, insisto em dizer internamente: “fique calma, isso vai passar”.
Perdoe-me, minha querida. Queria poder ter escrito um texto lindo, recheado de motivações e ouvir você responder que era exatamente isso que você esperava ler. Mas descobri há pouco, eu não sei mais escrever, só sei sentir o que sinto e não sei mentir, nem mesmo tentando, porque meus dedos não digitam o que minha alma não refletir.

Então, eu não ofereço à você uma crônica, eu te ofereço meu sentimento, já que a escrita foge à mim, talvez a minha leitura sirva à você.