quarta-feira, 9 de março de 2016

Na terra de gigantes



Ele era só um pequenino…
Seus olhos ingênuos permaneciam ressequidos,  acompanhando os dois gigantes à sua frente. Não estavam imóveis, porque seguiam os movimentos dos braços e voltavam-se para as bocas que proferiam linguajar maltrapilho, estridente, xucro.
Em seus belos poucos anos, desconhecia tamanho movimento alvoroçado, e não entendia tantos vocábulos e gestos de uma quase dança de mariposas gigantes, de asas rotas.

Sua ignorância tenra não permitia entender a curvatura negativa dos lábios, o volume alto e o tom esganiçado.
Não os vira frente a frente por tanto tempo, aliás, esta cena também lhe era desconhecida. Seu mundo era ocupado por um gigante por vez, e onde um entra em cena, o outro sai, sempre muito rápido, sempre sem palavras. Cada gigante com seu mundo, em cada mundo um ninho diferente, uma tela brilhante diferente, um odor diferente, uma comida diferente, uma prateleira inteira de companhias estáticas diferentes.
Para cada mundo, já adotara o comportamento apropriado: cada qual tinha uma regra, cada qual tinha um afago.

Enquanto via os braços grandes moverem-se e o som desagradável que proferiam os seus gigantes, só entendia que não entendia coisa alguma e com toda a sua força fechou os olhos e punhos, baixou a cabeça como quem bloqueia o que é externo e decidiu, em sua ignorância nata, que ignorante ele queria ser.
Ele não queria entender a falta de sorriso.
Ele não queria entender o alto volume.
Não queria entender tanta mudez.
Não queria entender tanto movimento grotesco e descomedido.
Ele não queria entender as conversas isoladas.
Ele não queria tamanha distancia.
Ele, simplesmente, não queria e não teria para si o que via no mundo gigante.
Decidiu ser ignorante para sempre.

Abriu os olhos e correu para as grandes pernas, envolvendo cada uma delas com seus pequeninos braços. E chorou, agora sim, choro entendido, de quem apenas não queria mais ver aquilo.
E emudeceu os gigantes.


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