quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Feliz Novo Dia

Então acabou?
Será?

Estão todos vibrando, excitados… comemorando um fim e brindando um início… e eu me pergunto: de quê?
Um número mudará, e passaremos a assinar uma data com final 16 (cá entre nós, quando nos acostumarmos com ela já será meados do mês de abril) e ainda assim, celebramos mudança como se as pessoas que somos, simplesmente, abrirão os olhos em outro corpo, outra forma, outra vida.

Não… por favor… não julgue-me antes de entender meu ponto de vista. Não sou pessimista, muito menos sou descrente em mudanças. Mas custo a entender tamanha excitação para um evento que é celebrado como se um milagre fosse acontecer.

Hoje é o último dia do ano de 2015 e você, como eu, viveu amores, dissabores, alegrias e tristezas durante os últimos 365 dias. 
O que fica para trás hoje, fica para trás todos os dias. O peso de tudo que acontece (aliás, os pesos e medidas) quem dá é apenas você! Isso mesmo…VOCE!

Não é a mudança de ano quem muda fatos, não é a mudança de data que muda o mundo. O que muda o mundo é a forma que você percebe, a forma que você trata, a forma que você retribui.

Muda o mundo você educar seus filhos, ser cordial, ter empatia, ser acessível, importar-se com a consequências de suas ações diárias e mínimas.
Muda o mundo tudo aquilo que você é, e todo o esforço que você faz para melhorar… a cada dia, cada segundo, cada nova ação (só mesmo nosso íntimo sabe quanto esforço têm dentro disso).
Muda o mundo você amar. Muda o mundo você respeitar. Muda o mundo você assumir compromissos e honrá-los, cumprir com seus deveres de cidadão, pai, filho, irmão, cônjuge. 
Muda o mundo você ser gentil (ahhhhh… como muda!), porque gentileza doa-se, desprendidamente, não interessa à quem.
Muda o mundo você ser cuidadoso com as palavras, ser verdadeiro, olhar nos olhos e não ter melindre. Muda também quando você não faz ao outro o que não gostaria que fizessem com você (clichê, mas muito real).
Muda-se o mundo economizando água, energia, reciclando… mas nada disso com intuito de diminuir a conta, mas com consciência de desperdício.
Muda- se o mundo quando aprende-se a afastar-se daquilo que tira sua tranquilidade ou daqueles que sugam sua energia. Nem sempre um volume grande de pessoas ao redor significa bem estar. Uma solidão tranquila pode ser muito mais aconchegante do que a presença de um acompanhante desequilibrado.
Muda o mundo quando para-se de provocar desconforto, em quem quer que seja, ou quando entende-se a não responder a uma provocação. 
Mudamos o mundo quando somos melhores em tudo que podemos ser, sem sermos radicais, porém criando consciência de nossos atos e atitudes. 

De nada adianta esperar mudança, sentados, de braços cruzados, ou apontando aos outros.
Não adianta aguardar a alteração em algo ou alguém, quando paramos em qualquer conforto (ou desconforto) e ficamos estáticos, cheios de esperanças, mas vagos em atitudes.

A mudança que almejamos começa conosco. É uma mudança íntima, nem sempre agradável, mas é a única forma de perceber modificação.
Não serão mais 365 dias para você ser uma nova pessoa. Será uma vida inteira de possibilidades, composta por 1440 minutos diários, onde demanda dedicação, zelo e cuidados, que somente uma visão desobstruída consegue promover.
De a si a chance de modificar-se a cada dia, medindo erros e acertos e tentando acertar um pouco mais a cada vez (não somos celestiais e temos que entender e aceitar esse fato).
Minta menos para você mesmo, seja verdadeiro sempre, ouça seus monstros internos e avalie-se sempre que puder. Não profira as palavras “eu sou assim mesmo”… ninguém ‘é assim mesmo’ e ponto. Há sempre a chance de mudar.
Afinal, para isso mesmo que existe o tempo, e os dias, e os anos... e amanhã é um ótimo dia para recomeçar ... Como o dia seguinte e o subsequente também serão.

Feliz novo dia para você. 





domingo, 20 de dezembro de 2015

Brit

Olhei para o frasco transparente contra a luz, em busca de algum líquido e constatei: não havia mais perfume.
Ainda assim, eu o borrifei  sobre a tatuagem, no pulso esquerdo. O que saiu foi misto de ar e fragrância pouca.
Senti o coração contrair em tamanho e disparar em velocidade desastrosa. Era como se um coração de passarinho ocupasse o espaço do meu e a velocidade e batidas diminutas foram sentidas em meu pescoço: aquele que não teria mais o borrifo do perfume.

Agora sim, estava tudo acabado.
A última gota, literalmente, havia saído daquele frasco que, até aquele momento, ainda guardava esperança.
Agora sim, não haveria mais lembrança.
Agora sim, um ciclo se fechara e o pouco que ainda existia, havia pairado em um ar saudoso, porém, fixo no pulso esquerdo.

Fechei a embalagem de vidro que possuiu 100ml. Conseguira, com muita economia, manter comigo o perfume comprado na avenida luxuosa de uma cidade francesa, há mais de ano e meio. Alternei com todos os perfumes possíveis (que não são tão meus quanto esse) para que, justamente, algum dia, ele pudesse ser sentido por quem a ele pertencia.
Mas agora, agora não há mais perfume.

Olhei para o espelho e constatei: absolutamente nada havia mudado nesse tempo todo de silêncio, com exceção das rugas que agora ocupam pele flácida. 
Pele que expressa o desencanto e o engano guardado em tantos dias.
Pele que envelheceu alguns anos em dois.

Me senti, mais uma vez, uma tola por acreditar em tanta palavra vaga de quem sabe muito sobre notas e pouquíssimo sobre música.

Aproximei o rosto do espelho, e olhei dentro de mim.
Eu ainda estava lá.
Eu sabia que ainda estava lá.
Respirei fundo, peguei o frasco oco e o depositei no lixo. Não precisei jogar. 

Agora sim, estava tudo acabado.
O borrifo miserável do braço esquerdo sumirá em poucas horas.
E algum dia, com alguma sorte, esse sentimento estúpido também.


 * De vez em Contos - Livro